Bruxelas projecta crescimento económico de 1,7% para Portugal em 2024

Comissão revê em alta as previsões para o desempenho da economia nacional, apesar do abrandamento face a 2023. Bruxelas aponta excedente orçamental de 0,4% e nova descida da dívida pública para 95,6%.

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Primeiro-ministro, Luís Montenegro, e ministro das Finanças, Miranda Sarmento Rui Gaudêncio
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Portugal deverá registar um crescimento de 1,7% em 2024 e de 1,9% em 2025, estima a Comissão Europeia, que nesta quarta-feira reviu ligeiramente em alta as suas previsões relativas ao desempenho da economia nacional, que se mantém acima da média da zona euro e da União Europeia (UE), tanto neste ano quanto no próximo.

As previsões da Primavera da Comissão Europeia apontam para um crescimento do produto interno bruto (PIB) em 2024 de 1% na UE e de 0,8% na área do euro, com uma aceleração em 2025 para 1,6% na UE e para 1,4% na área do euro.

Para Bruxelas, esta expansão, que é generalizada em todos os Estados-membros e se deve sobretudo ao aumento do consumo privado, “marca o fim do período prolongado de estagnação económica que teve início no último trimestre de 2022”.

“São moderadamente boas notícias. O retrato vai melhorar nos próximos dois anos”, afirmou o comissário europeu da Economia, Paolo Gentiloni, que antevê um maior dinamismo da economia em 2025, na base da recuperação do consumo privado, o aumento do investimento e a descida da inflação — que deverá atingir a meta dos 2% do Banco Central Europeu (BCE) durante o segundo semestre do próximo ano.

A estimativa para a economia portuguesa representa uma ligeira melhoria face ao cenário previsto por Bruxelas há três meses, quando apontava um valor mais conservador de 1,2% em 2024 e 1,8% em 2025, e também face às perspectivas avançadas quer pelo Fundo Monetário Internacional quer pelo anterior Governo, que no Orçamento do Estado para 2024 projectava um crescimento de 1,5% do Produto Interno Bruto.

No entanto, é uma desaceleração em relação ao desempenho do país no ano passado, quando Portugal se destacou na tabela dos Estados-membros da UE, cuja economia recuperou mais depressa da contracção provocada pela pandemia e da crise energética resultante da guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, com um crescimento de 2,3% do PIB.

Este ano, Portugal vai sair do top cinco dos países com maior crescimento, para ficar a meio da tabela, em 15.º lugar, no grupo dos sete Estados-membros cujo aumento do PIB está acima da média de 1% da UE, mas não chega aos 2% (e que integra, por exemplo, a Bélgica, a Irlanda ou a Polónia).

Segundo as previsões da Comissão Europeia, “o crescimento económico em Portugal deverá registar uma nova moderação em 2024, antes de voltar a aumentar em 2025, impulsionado pelo consumo privado e pelo investimento”. Bruxelas estima que a inflação prossiga a sua trajectória descendente e que as taxas de emprego e desemprego se mantenham relativamente estáveis.

No que diz respeito à execução orçamental do país, Bruxelas continua a contar com um bom desempenho e a projectar um saldo positivo para as contas públicas neste ano e no próximo. “O saldo das administrações públicas de Portugal registou um excedente em 2023, que se prevê que diminua em 2024 e 2025, embora permaneça em território positivo”, diz o relatório, que na base de políticas invariantes prevê um superavit de 0,4% em 2024 e 2025.

“Os nossos cálculos confirmam o retrato orçamental positivo de Portugal. Estimamos uma variação no excedente orçamental, que foi de 1,2% em 2023 e vai ser de 0,4% este ano e em 2025”, disse Paolo Gentiloni, precisando que a projecção já incorpora o impacto da baixa do IRS anunciada pelo Governo, “com impacto a partir de 2024 e 2025”. Mas o comissário disse que não foram tidas em conta outras medidas com potencial efeito nas contas públicas, por exemplo decorrentes das negociações para a revisão salarial de várias carreiras profissionais.

A expectativa da Comissão Europeia é a de que depois da redução de 13 pontos percentuais da dívida pública, que em 2023 baixou para os 99,1% do PIB, Portugal continue a fazer baixar o nível do endividamento “de forma constante, mas a um ritmo mais lento” durante os próximos anos.

“Os excedentes projectados para o saldo primário e o diferencial favorável entre crescimento e taxa de juro deverão fazer baixar o rácio para 95,6% em 2024 e 91,5% em 2025”, estimam os técnicos de Bruxelas. Um valor que, ainda assim, permanece bastante acima da média do rácio da dívida/PIB na UE, que este ano deverá estabilizar em 82,9% e subir 0,4 pontos no ano seguinte.

Como se lê no capítulo sobre Portugal do relatório, num contexto de condições de financiamento não restritivas, as despesas com juros deverão registar um ligeiro aumento. Em contrapartida, “o custo orçamental líquido das medidas de apoio à energia deverá diminuir para 0,6% e 0,5% do PIB em 2024 e 2025, respectivamente”.

Em relação ao investimento, Bruxelas nota que continuará a crescer “a um ritmo intenso” nos próximos dois anos por causa da execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e outros programas financiados pela UE. A subida do investimento e do consumo privado reflecte-se num aumento da procura de importações, que vão ultrapassar as exportações.

A Comissão sinaliza o turismo estrangeiro como um “importante factor de crescimento”, mas nota que o seu contributo para a economia será menor do que foi nos últimos dois anos. Mais importante é a contribuição dos imigrantes, que são responsáveis pelo “crescimento robusto” do emprego em Portugal.

“Os dados mostram um aumento substancial da população em idade activa no início de 2024, o que é explicado por fluxos migratórios positivos”, lê-se no relatório, que antecipa uma diminuição da taxa de desemprego nos próximos meses (para 6,5% este ano e 6,4% em 2025), “uma vez que a criação de emprego deverá absorver gradualmente o aumento da oferta de mão-de-obra”.

Sobre esse indicador, o comissário da Economia exprimiu a sua opinião pessoal. “Penso que a participação de imigrantes no nosso mercado de trabalho é muito positiva”, disse Paolo Gentiloni, lembrando que a UE tem de saber lidar com a questão do envelhecimento da população.

“Pessoalmente, gosto muito das estatísticas que mostram que a esperança de vida na Europa é a mais alta do mundo”, brincou o comissário, numa referência aos seus cabelos brancos. “Mas naturalmente que a questão do envelhecimento entra nos nossos cálculos e faz parte das nossas trajectórias, porque tem custos que precisam de ser resolvidos”, considerou.

Alemanha perto da estagnação

Para a Alemanha, Bruxelas projecta uma variação do PIB próxima da estagnação, com a maior economia do euro a crescer apenas 0,1%, seguida de uma progressão de 1% em 2025. Esta trajectória segue-se a uma contracção económica de 0,3% na economia alemã em 2023.

França, segunda maior potência económica da moeda única, deverá crescer 0,7% este ano, o mesmo que em 2023, e passar em 2025 para um ritmo de 1,3%. Itália segue o mesmo padrão, com o PIB a avançar este ano ao nível do ano passado (0,9%) e a acelerar ligeiramente em 2025 para uma variação de 1,1%.

Espanha é, entre as maiores potências, aquela que apresenta um maior ritmo de crescimento este ano. A Comissão Europeia prevê que, depois de um crescimento de 2,5% em 2023, o PIB espanhol registe uma variação de 2,1% este ano, mas para o próximo ano já antevê um abrandamento na quarta economia da zona euro, com o crescimento a passar para 1,9%.

Para os Países Baixos, a projecção é de uma variação de 0,8% em 2024, seguida de 1,5% no ano seguinte.

Incertezas sobre inflação

Bruxelas nota, no comunicado que acompanha a divulgação das previsões, que os riscos de “revisão em baixa das perspectivas económicas aumentaram nos últimos meses, principalmente devido à evolução da guerra de agressão prolongada da Rússia contra a Ucrânia e do conflito no Médio Oriente”. O momento continua a ser de incerteza, com as tensões geopolíticas a representarem riscos. E apesar de a inflação estar a diminuir e que Bruxelas admita que o objectivo de 2% “ligeiramente mais cedo em 2025 do que o projectado” nas previsões divulgadas no Inverno, “a persistência da inflação nos Estados Unidos [EUA] pode conduzir a novos atrasos nas reduções das taxas nos Estados Unidos e noutros países, resultando em condições financeiras mundiais um pouco mais restritivas”.

É neste contexto que a Comissão não descarta que, se isso se verificar, a descida da inflação possa ser mais lenta do que o assumido agora, levando o BCE e os outros bancos centrais dos países da UE (de fora do euro) a atrasarem “os cortes nas taxas de juro até se verificar uma descida da inflação dos serviços”.

“Alguns Estados-membros poderão adoptar medidas adicionais de consolidação orçamental nos seus orçamentos para 2025 — actualmente não tidas em conta nestas previsões — que poderão afectar o crescimento económico no próximo ano. Ao mesmo tempo, uma diminuição da propensão à poupança poderia estimular o crescimento do consumo, enquanto o investimento em construção residencial poderia recuperar mais rapidamente. Os riscos associados às alterações climáticas afectam cada vez mais as perspectivas”, sublinha a Comissão Europeia.

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